O Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (MASP) passou a abrigar, desde o início de setembro, obras de dois artistas indígenas amazonenses em seu prestigiado Acervo em Transformação.
O autorretrato da artista Duhigó, do povo Tukano, e a marchetaria Sûophoka, de Dhiani Pa’saro, do povo Wanano, seguem em exposição, marcando um momento histórico para a arte indígena e amazônica no cenário nacional.
O MASP, considerado o museu mais importante do Hemisfério Sul, mantém no segundo andar do edifício projetado por Lina Bo Bardi sua mostra de longa duração, onde as obras são apresentadas em “cavaletes de cristal” — placas de vidro encaixadas em blocos de concreto, sem divisórias. Essa proposta expositiva permite uma experiência de contemplação aberta e democrática.
Um acervo em constante movimento
O Acervo em Transformação é a exposição mais emblemática do MASP e se renova periodicamente com a inclusão de novas obras. O espaço reúne desde grandes mestres da arte mundial — como Van Gogh, Monet, Picasso e Modigliani — até artistas contemporâneos e narrativas antes ausentes dos museus, como as histórias indígenas, afro-atlânticas e brasileiras.
Segundo o galerista Carlysson Sena, fundador da Manaus Amazônia Galeria de Arte e representante dos dois artistas, a presença amazônica no MASP simboliza uma conquista coletiva.
“É um momento de grande emoção e orgulho para a arte contemporânea indígena e amazônica. Ver nossos artistas compondo o acervo ao lado de grandes mestres da arte mundial é a prova de que a arte da Amazônia ocupa hoje o espaço que merece na história da arte brasileira”, afirmou Sena.
Duhigó: pioneira da arte indígena contemporânea

Nascida em Paricachoeira, região de São Gabriel da Cachoeira (AM), em 1957, Duhigó é considerada uma das pioneiras da arte indígena contemporânea no Brasil. Sua obra no MASP é um autorretrato em tamanho real, com dois metros de altura por 1,20 metro de comprimento, que já integrou a exposição Histórias Brasileiras (2021-22).
A pintura retrata a artista imersa entre águas e floresta, evocando o rio, a cachoeira e os grafismos do povo Tukano. O fundo da tela é inspirado em uma lembrança de infância — uma viagem de canoa entre o Brasil e a Colômbia — que marcou sua conexão com a natureza e a ancestralidade.
A obra foi doada ao MASP pelo casal Fábio Ulhoa Coelho e Mônica Andrigo Moreira Ulhoa, e desde então tem atraído a atenção do público pela força simbólica de sua presença.
“Foi uma maravilha na minha vida e na minha carreira. A minha obra foi selecionada, e isso foi algo realmente maravilhoso. Agradeço ao Carlysson, ao Adriano Pedrosa e à equipe do MASP, e também ao casal que fez a doação”, declarou Duhigó.
Dhiani Pa’saro e a ancestralidade transformada em marchetaria
Também natural de São Gabriel da Cachoeira, Dhiani Pa’saro, do povo Wanano, ganhou destaque nacional pela forma como transforma filetes de madeira em narrativas visuais.
Sua obra “Sûophoka” (2023) — que significa “peneira” na língua Wanano — é feita com mais de 20 tipos de madeira e utiliza a técnica da marchetaria para representar a ancestralidade e os símbolos de seu povo.
Inspirada nas peneiras tradicionais do povo Wanano, a peça traz no centro a figura de um beijú, alimento ancestral feito a partir da mandioca, e homenageia o avô materno do artista, do povo Kubeo, de quem aprendeu os trançados.
A obra, também doada por Fábio e Mônica Ulhoa, foi destaque na exposição Geometrias (2023), durante a inauguração do edifício Pietro, expansão do MASP.
“O meu sonho se realizou quando minha obra foi adquirida pelo MASP. Sempre quis que isso fosse lembrado futuramente, que meu nome estivesse escrito nestes museus”, afirmou o artista.

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